Müller Martini – Um regresso desejado
Esta crónica caracteriza uma situação em que, pela força das circunstâncias nos vemos obrigados a renunciar a posição adquirida, com a consciência de ser um recurso com custos económicos e sentimentais elevados, mas decisivo num cenário em que as vantagens comparativas são determinantes.
Na actividade empresarial, o trabalho de construção de uma empresa começa pelo estabelecimento de metas e objectivos que orientem a sua projecção no futuro.
Todos os empresários, logo no início da sua actividade como tal, desenham cenários sobre o devir das suas empresas, naturalmente interessados em que o projecto prospere e se desenvolva para que os objectivos sejam atingidos no futuro.
Como as empresas se inserem num contexto económico, por vezes imprevisível, que as condiciona, a sua actuação há-de basear-se sempre em conjecturas que têm a ver com esse contexto. Parece claro que este facto terá de estar sempre presente nas acções de gestão que se vão praticando.
Além disso, a par de cumprirem com determinado conjunto de objectivos que norteiem a sua actividade, de forma linear e controlável, tem também de haver a consciencialização de impor padrões que as distingam pela confiança que inspiram no mercado, preservando o respeito pelos compromissos com fornecedores e clientes.
São ainda de considerar os factores sorte e azar, que tanto podem beneficiar como afectar a actividade empresarial. São imprevisíveis e acontecem inopinadamente, podendo criar situações diferenciadas nas consequências. Se é o azar que bate à porta pode destruir todos os esquemas estabelecidos e anular todas as previsões construídas para o desenvolvimento de um determinado objectivo. Daí que, mesmo que estejamos convencidos que todos os pressupostos estão garantidos, estamos sempre sujeitos a demasiados imponderáveis que, de um momento para o outro, podem alterar o curso da vida das nossas empresas.
Praticamente, desde o início da Grafopel, lutando por isso, tive a grata oportunidade de representar a Grapha Müller, que mais tarde viria a denominar-se Müller Martini (MM). Nesta empresa encontrei sempre um ambiente familiar cordato e empenhado em identificar as melhores soluções de cooperação, e os enzimas de confianças e de motivação constante para desenvolver o meu papel de representante, com a eficácia e os pressupostos a que me comprometi.
Apesar de, na altura, ser de entre todos os representantes o mais modesto, não encontrei nunca qualquer dificuldade na minha relação com os responsáveis da empresa. Bem pelo contrário, observei sempre na atitude de toda a família MM a mesma atenção e consideração que dispensavam aos mais importantes.
Relacionamento familiar informal; cumprimento de compromissos; fomentar sinergias; práticas equitativas; regras de jogo claras; coesão organizativa para uma resposta permanente na hora, tendo em atenção a necessidade de agir com sentido de urgência, tanto na área comercial como na técnica, eram práticas que conservo presentes, que vinculam o respeito pelo princípio de atribuir e partilhar responsabilidades.
Gratamente, reconheço a importância do significado da MM no início de vida da Grafopel face aos excelentes resultados que foi obtendo ao longo dos anos, em que atingiu uma quota de mercado superior a 80%.
Neste mundo de competição entre empresas, a sustentabilidade de uma representação é sempre precária. A sua perpetuidade está sempre sujeita à ditadura das circunstâncias.
Algo que às vezes é imposto por interesses conflituantes entre representadas, obriga a tomar decisões de difícil resolução, que nos deixam a alma a sangrar, e tendem a desenvolver conflitos de consciência em quem tem a responsabilidade de decidir, de forma corajosa e responsável, pelo parceiro de negócio mais vantajoso naquele momento.
Foi justamente o que aconteceu quando, num período de alteração do paradigma estratégico da Heidelberg, que teve por objectivo o desenvolvimento de produtos conflituantes com o programa da MM, inibiu a Grafopel de continuar a representar ambas as empresas, tendo de renunciar a uma delas, alterando assim todos os pressupostos de amor a uma camisola que teve de despir. Tal facto constituiu uma fonte de constrangimento face à excelente relação existente, e às inúmeras oportunidades de negócio perdidas.
Dezoito anos depois, uma nova alteração de paradigma estratégico da Heidelberg, marcada desta vez pela venda à MM daquilo que lhe era concorrencial, veio permitir à Grafopel voltar a vestir a mesma comisola, e orientar a sua actuação futura com a MM, com o mesmo espírito de entrega do passado.
É uma circunstância que reflecte, afinal, a resposta adequada e generosa a uma das mais secretas e mais desejadas aspirações radicadas na vontade do autor desta crónica, desde quando, por força da situação criada com grande constrangimento, teve de renunciar uma representada que contribuiu significativamente para a projecção da Grafopel, e com a qual sempre existiu um excelente, que nunca se extinguiu.
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