Encontrar agulha em palheiro - cont.

Cá estou de volta a continuar a crónica anterior, para mostrar os equipamentos utilizados em 1908, para produzir a Illustração Portugueza, edição semanal do Jornal O Século.

Por vício de ofício, tento deixar aos presentes e vindouros o sudário real de uma época que o tempo engoliu, mas que reflecte com implacável nitidez que a vida, em todas as épocas, é uma dura penitência. O documento aqui fica referenciado, à atenção de quem o quiser ler. Com o espaço reduzido de que disponho, não é possível apresentar o texto e as imagens no seu todo, mas a amostragem dá para ajuizar a carga de trabalhos que era produzir um jornal ou uma revista.

“Com a devida vénia, vamos tomar pelo braço um leitor e introduzil-o na sala de redacção onde se prepara, n´este momento, o plano do número da próxima semana, para observar a soma de árduos esforços para produzir cada número. Começa-se por combinar o menú (…) e descriminar quaes os assumptos que apresentam maior actualidade (…) Calcula-se quantas páginas exige a reportagem photographica dos acontecimentos da semana e trata-se da illustração dos artigos selecionados em obediência áquelle critério(…) Essa illustração nem sempre é fácil. Se se trata de uma monographia histórica, por exemplo, é preciso procurar retratos e gravuras, que nem sempre são fáceis de encontrar (…) Há, também, que fazer a distribuição das gravuras correspondentes a cada artigo, calculando, o espaço que o texto e todo o conjuncto demamdam.

Cada semana o reporter photographico não faz regularmente menos de quinze dúzias de chapas…Cortadas as photographias e dispostas conforme devem compor as páginas, (…) os respectivos originaes são enviados á officina da photogravura. O leitor assiste às diversas operações sucessivas a que vae proceder-se: a primeira é a reproducção photographica (…) os clichés passam, em seguida, para a secção do pelliculado, para serem invertidos. Emquanto seccam, vae-se preparando a chapa de zinco com o esmalte photographico, e, pondo depois este em contacto com o negativo, realisa-se, por meio da luz eléctrica, a impressão respectiva (…) seguem-se as operações necessárias para obter o desenvolvimento da imagem e a sua esmaltação com o auxílio do fogo (…)   tira-se uma prova em papel (…) que serve para o paginador typographico se guiar(…) é a primeira prova das gravuras que figurarão no próximo número (…) as chapas de zinco passam seguidamente para as mãos dos gravadores a meia tinta, que executam esta parte da gravura (…)Tira-se então uma segunda prova para apreciar o resultado definitivo do gravado, e a chapa de zinco transita para a officina de carpinteiro, a fim de ser montada sobre madeira (…) é entregue depois à officina typographica, que vae organisar a página do jornal, preenchendo com o texto já composto,  e que se recorre na medida necessária, o espaço que não é occupado pelas gravuras. E começam as torturas para que esse espaço disponível não sobeje nem escaceie. Umas vezes o artigo é maior, e tem que apertar-se, para fazer o milagre de metter o Rossio na Betesga. De outras, ao avesso, não chega e é preciso estical-o ou accrescental-o. As afflicções por que a gente às vezes passa!

Obrigado pela vossa companhia neste breve regresso ao passado.

A seguir, desceremos até à casa das máquinas, para assistir à impressão da capa e das folhas. Em uma machina especial corre a impressão das capas, feita a três cores. Em outra prossegue a tiragem da primeira folha de 16 páginas. A segunda folha é impressa em uma terceira machina. Depois de seccas as folhas, passam d´ali para a dobragem e brochura, ficando o número prompto: os dois cadernos que o constituem, devidamente enfaixados e cosidos com capa. Accumula-se um monte sob a faca da guilhotina, para os aparar. É a última operação material de 24.000 exemplares da Illustração Portugueza. Com esta última operação, está prompta para venda. “

 

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